sexta-feira, 4 de fevereiro de 2011

O fino véu entre céticos e crentes

De nariz empinado, eu sempre me disse a maior ceticona. É sério e rijo: eu não acredito em reencarnação, eu não acredito em ETs, eu não acredito em visitas de almas do além, eu não acredito em duentes. Eu não acredito no monstro de Lock Ness, mas bem que eu queria que fosse verdade. E eu queria acreditar em fadas porque, óim, são tãão bonitinhas! Mas só acredito nas fadinhas da Disney mesmo. Só que daí, né... bom, o ceticismo, eu acho, sempre resvala em alguma parede, em algum momento, pra todo mundo.

Demorou, mas eu descobri o meu momento. E quando ele acontece, eu me pego acendendo vela, caindo de joelhos, chorando e soluçando e pedindo à Maria, a mãe de todas, que zele por nós, por favor, por favorzinho! Faço qualquer negócio.

Esse meu momento é quando minhas filhas adoecem. Tenho tanto medo de perder essas meninas pra uma doença grave que, a um sinal de febre, começam os tremeliques. Fico nervosa. Fico arfando. Fico atazanada e perco a noção. Não deixo de me recompor, porque afinal elas precisam é de um adulto de cérebro operante, não de uma louca em pânico, mas fico assim, baratinada. E aí eu me pego com... com... com "um outro lado", vamos dizer assim.

Não tenho medo de confessar, eu ainda não acredito em Deus. Não na versão oficial de Deus, pelo menos, aquela sobre um homem de roupão branco, sentado na nuvem, anotando pontos positivos e negativos num caderno e botando pra quebrar nos não-crentes de Sua pessoa. Minha versão de Deus é humana. Deus vive dentro de nós, é apenas uma voz interior que sabe separar certo de errado, que têm uma consciência coletiva e pode sim, com a força dos braços e da mente unidas, operar reviravoltas nunca dantes imaginadas. Nós somos deuses, se a gente agir de acordo.

Acredito que Deus é aqui e é agora. E a forma que encontrei pra me comunicar com esse momento, quando bate um desesperozinho, foi falar com Maria e confiar nisso. Maria foi a mãe de Jesus e, ao que consta à História, sofreu pra um cacete. Como mulher, como mãe e como cidadã, não teve momento pior, teve? Pois se ainda assim ela segurou, peço que me ajude a segurar também - ainda que por motivo muuito menor. Acho na verdade que Maria vive em mim apenas - sou eu falando com meu interior, com a minha auto-confiança, com meu equilíbrio, e não exatamente com uma mulher que viveu há 2 mil anos. Que seja. É o meu momento.

É um pouco chato quando junto as mãos e converso e acendo uma vela pra ver a luz e vem um dizer "ué, mas não é você a supercética?". Sinto um tom de ironia quase cruel? Fazer o quê? Eu continuo não acreditando que a gente morre e entra na fila de espera pra nascer de novo, mas acredito na vibe. Sabe a vibe? Pois é, a vibe.

Quando a gente foca, seja no que for, as ações acompanham. Essa é a vibe. Posso firmar o pensamento aqui e acreditar que, sim, ajudou minha amiga que mora lá longe só porque ela soube que tinha alguém compartilhando a dor com ela. Posso desejar muito um acontecimento e, por obra minha mesmo e da gana mental, vê-lo concretizado. E posso, sim, tentar usar uma boa vibe pra acreditar que as minhas meninas vão melhorar do que as aflige.

Ser muito cética, enfim, não me impede de ter esse momento de fraqueza e, nele, ficar meio espiritual. Porque quase nada, eu aprendi, precisa ter uma resposta só.


Nem que seja só pra ver na escuridão...

9 comentários:

Monique disse...

Ai, eu tenho uma raiva dessa gente que diz "ai, mas você não pensava desse jeito x?". "Pensava, ué, mudei de ideia! Não pode? E vou mudar de novo daqui a cinco minutos. Que cê tem com isso?!". Só que eu costumo ser mais grosseira. =P

Sempre que me perguntam se eu acredito em Deus eu digo que não. Mas eu rezo toda noite. Vai ver eu acredito. Eu acho que na maioria das vezes eu não acredito e que na hora de dormir faz mais sentido. Nem tudo precisa de explicação lógica. >.<

Atena disse...

Sou mais ou menos como você (já freqüentei fóruns e grupos ateus e me considero agnóstica mas acho que muitos deles são tão inflexíveis que se tornam dogmáticos demais) e isso não me impediu por exemplo de tomar as pílulas do frei Galvão que uma amiga trouxe ao saber da minha gravidez (a atitude de preocupação dela pra mim foi um gesto positivo e por isso aceitei a ajuda).

Eu acho o seguinte: a vida é um mistério, não há como negar isso. Não dá pra buscar coerência na existência, então por que temos sempre que ser coerentes? Eu me dou o direito de ser incoerente sendo agnóstica e ao mesmo tempo acreditando que existe alguma 'coisa, energia ou sei lá o que' boa que eu não compreendo mas que pode produzir efeitos se eu me aproximar dela de alguma maneira...

Eu acho que é melhor viver incoerentemente quanto ao desconhecido (principalmente se isso nos faz bem) do que desse jeito duro, imóvel e impassível, de não aceitar absolutamente nada que não esteja sumariamente provado...

Ah, a Chicória que mandou o link no outro post anterior era eu, rs...

Nanael Soubaim disse...

Flávia, mande essa gente ir caçar o que fazer. Se te exigirem satisfações, peça a promissória do que lhes deve.

Meu ceticismo não resistiu aos factos e às investigações sérias que fiz.

Dri_ disse...

Também acendo uma vela, olho fundo naquela luz, respiro mais fundo ainda e... peço, choro, converso. Dá uma acalmada quando a situação tá crítica (geralmente febre de filho...).


Quando tá tudo bem, passo pela Nossa Senhora lá quietinha e a cumprimento, sorrateiramente, às vezes formalmente mesmo. E assim tem sido, porque a Igreja mesmo deixei de ir faz tempo (menos mês passado quando meu pai teve um infarto, aos 80 anos, e aí eu precisei foi de um Templo mesmo...)

Mas sabe o que eu mais gosto à noite? Conversar com Deus olhando as estrelas... Fixo em uma bem grandona, ou na menorzinha que eu encontrar e aí fico lá, da janela, falando... falando... Porque to passando por isso? To fazendo a coisa certa? É assim que educa filho?
Depois vou dormir tranquila, como quem teve uma conversa boa.

Marcelo disse...

Montaigne, citando Platão, disse que poucos ateus o são na hora da prova. "Uma boa estocada no peito, e ei-los de mãos postas implorando o céu." E acrescentava que mesmo céticos sentem um certo estremecimento ao entrar numa Notre Dame. Montaigne era um cara exótico, cético naturalista de um lado e se professando católico do outro. Gilberto Gil, tb, canta que "mesmo a quem não tem fé, a fé costuma acompanhar..."

Eu acho tão mais estético e mais poético crer, mas tenho um amigo ateu que acha mais poético ver a fé de fora, de um jeito "antropológico". Sei lá...

Sócia da Light disse...

Bom, Dani, eu não lembro de ter falado em qualquer relação "crença X fraqueza". Aliás, eu nem lembro de ter falado de religião também, eu falava mesmo é de ser cético e de ter seus momentos de dar um passo noutra direção. Só isso. Mas se é uma pergunta de fato, e não retórica... eu diria que é pior um fanático religioso! Mas é só uma opinião.

Marcelo, o assunto é poético mesmo - e, concordo, se a gente levar pro lado da poesia, todo cético costuma se derreter diante de muitas coisas, como a linda Notre Dame. Eu derreti. Mas nem pensei nessa ligação, porque, oras, eu não vejo esse clichê do cético estúpido, turrão, amargo e seco por dentro. Não acho que uma coisa tem a ver com outra. Os céticos, aliás, são as gentes mais incompreendidas, como se só fosse aceitável crer piamente. Humft!

Dri, as estrelinhas também me encantam! E são tão conversáveis!
:-]

Monique, eu amo e adoro esse seu coração sincero e doce. Em você eu acredito! :-*

moniquinha disse...

Flá,
eu não me achava cética,mas depois de ler o texto mudei de ideia..rs

Olha,
acho tão complicado,para mim,é sinal de fraqueza recorrer a algo ou alguém
que nem sei se realmente existe,eu nunca que acendi uma vela(a não ser em apagão,mas n conta..rs) nem mesmo com filhos doentes e já tive um que por muito pouco, não se foi. Enfim,não sou bem resolvida ,ainda, no tema,mas fico realmente tocada qdo alguém diz que está rezando ou acende uma vela por mim,assim,por nada sabe,simplesmente por me querer bem,algo como a tal good vibe.

Atena,qto tempo!
bjs(smurfete)

Chicória disse...

(licença, Flá)
Smurfete! :o)))

Fabio disse...

Sou cético até a ponta da unha encravada no dedão do pé direito, como você sabe (acho)! O que acho que acontece nessas horas é que nós, como todas as outras pessoas, nos valemos de algum simbolismo pra que uma certa "força interior" seja canalizada pra algo positivo, nem que esse algo positivo seja apenas um pouco de tranquilidade num momento difícil. Existem vários jeitos disso ser feito, e creio que cada pessoa tem o seu jeito. Não rezo desde que virei eu mesmo, e duvido que volte a rezar algum dia, simplesmente porque esse simbolismo não "cola" mais pra mim. Mas acho que faz parte do crescimento aprender seu jeito pessoal de canalizar esse algo positivo e tranquilizador que temos dentro da gente, seja rezando ("de mentirinha", no ceticismo), vendo as estrelas, ouvindo um bom disco do Pink Floyd, ou qualquer outra coisa. Quem não consegue fazer isso em momentos graves tem uma séria chance de pirar com o tempo.