quarta-feira, 13 de março de 2013

Uma nova revista para elle, ops, ela

Aí chegou a década de 1990 e todo mundo que tinha desconfiado ganhou certeza: o cigarro era coisa ruim mesmo. Rolou processo, protesto, piti - e um monte de filmes pra falar que a indústria do tabaco era feia e boba e mentiu dizendo que pitar um fumo era sucesso, quando na verdade era tiro na testa. Passados todos esses anos, até Hollywood (a do cinema, não a do "sucesso") desencanou de produções contando os bastidores do que todo mundo já sabia. Cigarro, a longo prazo, causava doença, morte e um futum lazarento na pessoa. Cigarro fazer mal é notícia velha. Então a gente já pode colocar na mesma seara as revistas femininas e essa coisa de "oh, elas estabelecem uma ditadura de beleza inalcançável e condena todas nós a morrer pobres, deprimidas, barangas e humilhadas!"? Chega, passou. Revista feminina te faz mal? Para de consumir, oras

O caso é que as revistas femininas de fato acabaram se enrolando em todo o processo de aquisição do "girl power" e, com os anos, o que era um periódico pra falar dos vestidos rodados da moda e de como arrumar bem a casa pro marido virou um emaranhado de informações loucas e/ou dispensáveis. Porque quantas matérias sobre biquínis, dietas e scarpins a gente consegue ler na vida? A maioria já deve ter tido sua cota.

As revistas femininas no Brasil, hoje, se limitam a meia dúzia de títulos que versam muito sobre roupa, sapato, maquiagem, cabelão e celebridades. Fazer o quê? Talvez as pesquisas digam que a mulher brasileira quer ler isso aí, ué. Eu, de minha parte, acho que pesquisa é o cacete e bom seria parar de ir sempre na mesma onda e criar a tendência, mostrar para a leitora uma coisa nova, descobrir e oferecer um caminho, e não servir só o arroz com feijão de anteontem. Isso dá azia. E gases. Ó, vai ver é por isso que as moças saem com aquela cara na foto da capa!

Eu sei, parece mesmo uma ditadura de gente fazendo carão (carão de quem não sabe multiplicar número de dois dígitos), vestindo roupas que só ficam bem em coxas que não se roçam, usando sapatos que causam joanete, sugerindo cardápios de água, torrada e peito de peru do café ao jantar e apostando que cremes anti-idade são máquina do tempo.

Mas não é uma ditadura que te aponta revólver, joga no bagageiro e leva pro porão escuso, tá? O jornaleiro não vai te perseguir pelas ruas se você disser "não, Juarez, obrigada mas hoje eu prefiro não levar a Fulana porque essa atriz da capa me assusta com tanto aplique e brocado e eu não gostei dessa chamada sobre '879 maneiras de trancar seu homem num cativeiro até ele te amar de verdade'". Juarez não liga. Você devia ligar menos também.

É só entretenimento, gente. Só isso. Digo com certeza, por conhecimento, que a revista não é uma entidade inteligente programada para desgraçar mulheres. A revista é um objeto inanimado feito por moças comuns, como eu e você, que comem, bebem, dormem, dormem com vários caras até achar o certo, dormem na reunião de pauta chata, viajam, vão ao cinema, têm filhos, problemas e contas a pagar. Elas são, na maioria, normais e bacanas - ao contrário do que Anna Wintour e "O Diabo Veste Prada" andaram propagando por aí.

Elas fazem o melhor que podem com a abertura que têm. O problema, se é que existe algum, talvez seja esse mesmo: no afã de encantar só a diretoria com centenas de páginas cintilantes, as revistas esqueceram de encantar as moças que trabalham ali mesmo. E eu. E você, garota comum. Gente que apenas acorda... gente. Que não é mulherzinha o tempo in-tei-ri-nho - e talvez gostasse de ler mais sobre lugares interessantes, sobre móveis ecológicos, sobre uma noite no karaokê e até sobre como dar um up no guarda-roupa sem gastar um carro zero. Reportagens legais pra pessoas de verdade que, sim, são mulheres e gostam de uma linguagem focada em si, com a sua pegada feminina, um pouco feminista, bastante maricota às vezes mas não sempre.

E, eu sei, dá raiva quando dizem que "mas então, temos sim este mês uma entrevista com a Isabel Allende e uma reportagem sobre o tráfico de crianças no Malawi!". Sim, e duas páginas depois tem uma moça com a silhueta característica do Malawi desfilando casacos com o valor do PIB do Malawi. Botar uma entrevista-cabeção em revista feminina, hoje, é como botar uma página de texto corrido na Playboy - é sistema de cotas apenas. Não é sério.

É isso, não é sério. Não leve a sério. E, se perceber que tá levando a sério, larga a coisa! Ninguém é obrigado a se basear em publicações. Se o lanche comprado no McDonald's não parece com o da foto, porque a gente precisa parecer?!

Pede ao Juarez da banca uma revista de viagem. De culinária. De esporte (mas só se amar futebol, que outra coisa quase não tem). Aposta em uma edição sobre patchwork, quem sabe você não se descobre um gênio da costura? Compra um caderno de violão. Compra um gibi! Eu recomendo os da Disney, estão em ótima fase. Ou compra mesmo a revista feminina, ignora o que parecer balela e segura o que é bom. Nem que seja a amostra grátis de perfume.

Na era da tecnologia, assina no tablet uma edição estrangeira - aproveita pra treinar um idioma e testar revistas nicho de mercado, que no exterior tem muita. Muita. Dá pra assinar revista só sobre primatas. Albinos. Do ocidente. Pode apostar.

O que não dá mais é pra se diminuir perante uma garota de 17 anos com o quadril de um melão e a pele de juventude e achar que o mundo vai te cobrar ser assim também. O mundo tá nem aí. Aliás, ele saiu há horas pra fumar um cigarro e não voltou.


Fica fria, não é o general da ditadura, é só... uma moça com muita dor de cabeça?


4 comentários:

Dani disse...

Olá! =)

Acompanho seus textos desde a época das Garotas que Dizem Ni (saudades! Era uma das coisas que eu mais gostava, e que mais me incentivavam a ler), e, apesar de o site primordial ter acabado, vejo que seu talento com as palavras só aumentou!

Sobre o assunto, concordo plenamente. Adoro revistas de "mulherzinha", mas nossas vidas não se resumem ao glamour que encontramos nessas páginas. Pensando bem, talvez até seja aí que está a graça, escapar por uns minutinhos da realidade mas sem voltar achando que a vida real é uma droga =)

Anônimo disse...

Obrigada pelo suspeiro que eu dei agora!

"Folheio" estas revistas em consultorio médico e penso: carai... tanto $ jogado fora, poderiam diminuir no $ da consulta.

E pior dos piores: Tenho parente que faz ASSINATURA ANUAL, com filhas adolescentes em casa... pensa bem?!
Dri

Anônimo disse...

...suspiro...

Sócia da Light disse...

De nada pelo suspiro! :o)

Dani, leitora antiga, que bom se manifestar aqui! Olha, com certeza esse é o segredo disso e tudo o mais: parar de achar melhor o entretenimento que a vida real. Fantasiar é divertido, voltar pra Terra também, né? Um beijo!