Olha, cada dia era um susto, viu? Meus anos de criança foram lindos e ótimos e felizes, mas tinha cada neura embutida ali... Fora os medinhos comuns de petiz, como dormir sem deixar nenhuma ponta de pé ou mão fora do perímetro da cama, de puro pânico que "algo embaixo da cama" me puxasse, tinha outros. Muuuitos outros.
Pra começar eu tive medo do básico: do primeiro dia de aula, do pirata que ilustrava o fascículo de História da enciclopédia "Conhecer", de me perder da mamãe no mercado. Tive medo ainda de que meus pais se separassem a cada briga deles, de que minha mãe fosse presa na greve ou de que meu pai perdesse o emprego (vai ser criança nos anos 80, no ABC Paulista, com família metalúrgica e Maluf governador biônico, pra ver se você não faz xixi na calça de pavor...).
Mas então, ao crescer só mais um pouquinho, vieram medos muito típicos de menina. Eu tenho certeza, moleque algum sofreu com aquilo, era coisa só de menina. Por exemplo: ainda pequena eu passei a temer que amigas de cantos distintos, como a amiga da rua e a amiga da escola, se conhecessem e se adorassem, me deixando de lado.
E aconteceu, viu - o que mostra que medos infantis nem sempre são improcedentes. Aconteceu, sim: minha amiga Vanessa veio brincar em casa e conheceu minha amiga Laura. E as duas se entenderam de cara, deixando a mim, na qualidade de "amiga velha", um pouco largada. Durou uma tarde, mas pareceu uma vida.
Teve também o medo contrário. Uma vez minha prima Cássia, então amiga unha-e-carne plus parente de sangue, veio brincar e quando se juntou à nós a Daniela, amigona da escola, se odiaram eternamente. Durou uma tarde, mas... não, aí pareceu só uma tarde mesmo. Eu já estava grandinha.
Grandinha, no entanto, me assolaram medos ainda maiores. Por exemplo, o medo de não ser mais vista pelos meninos como um membro da gangue, mas... aimeodeus!, como menina! Sim, eles um dia param de nos ver como aquela que joga bem futebol para nos ver como humana com curvas. Pois é. Éca. E quando começaram a fazer graça dizendo que o Danilo gostava de mim, então, eu quis cavar um buraco até o lençol freático e por ali nadar até o mar.
Coitado do Danilo, nisso tudo, que se tornou objeto de aversão pra mim. Não podia mais olhar o menino no rosto. Não podia sequer almoçar no mesmo mesão que ele (mesmo havendo cerca de 22 lugares ocupados entre nós). Ficava vermelhíssima e com ataque de pânico.
E vieram medos similares - de que a saia do uniforme levantasse com o vento; de me acharem "menos menina" porque a nota foi baixa; de descobrirem minha paixonite pelo menino-gênio da classe. Veio o medo de não ter par no bailinho (nunca aconteceu), de não ter uma amiga na mesma sala quando mudava o ano letivo (nunca aconteceu), de ser alvo de chacota e perseguição pela molecada "famosa" da escola (aconteceu pra cacete, anos a fio).
À maioria dos medos, eu sobrevivi. Vieram outros em plena fase adulta, é claro, mas a gente vai encarando melhor. Hoje os medos são raros - grande parte relacionado à vida das minhas filhotas, à integridade física do Dono da Casa e aos sapos (o medo desses bichos malditos nunca me largou, do berço à universidade, que inferno...). Ah, tem também o medo abissal que me domina toda vez que abro o internet banking, mas, né... O negócio é ignorar do mesmo modo que ignorei o "algo embaixo da cama", virei pro lado e dormi.
O medo pode vir, nem ligo. Eu sempre vou ser uma menina cheia dele mesmo. E sempre tentando ser mais e mais valente.
segunda-feira, 13 de dezembro de 2010
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8 comentários:
Me identifiquei com a maioria dos seus medos... mas o meu maior medo (que nunca aconteceu) era que ninguém fosse ao meu aniversário.
Na verdade eu praticamente tinha ataques de pânico horas antes da festa começar.
Sempre sobrevivemos aos medos, eles é que não sobrevivem sem nós.
Nossa!!
Anos 80 ,morria de medo da guerra fria ,meu irmão + velho(sempre eles)
vivia me dizendo que se um dos países apertasse um botão,o mundo explodiria,e quem não morresse na hora,não escaparia dos efeitos da radiação depois,af!
E meu pai perdeu o emprego em 1982!
morria de medo de parar debaixo da ponte,ahaha.
Medo da radiação! Da guerra! E do comunismo!!! Como iam viver 5 famílias na minha casa?
(Eu passei muitas noites acordada ouvindo o barulho da radiação chegando...)
Pô, sabem que do comunismo eu nunca tive medo? Tinha até uma simpatia... Achava que seria mó divertido ter mais famílias e crianças morando na minha casa! Muito mais gente pra dividir as tarefas e pra brincar de passa-anel.
;-]
D. Sócia, antes de tudo eu devo dizer que olha, eu quase chorei qndo encontrei esse blog... vc pode não entender, mas é um trauma nao te ler mais desde o fim do Garotas, vc nem imagina. Sério. E nem acredito que já existe a Olivia!!! Eu sempre pensei q vc tinha que repovoar o planeta, nao me leve a mal, nao é que eu queira seu oco, mas acho q vc daria jeito em todo mundo. Com rotina ou sem, hehehe...
No mais, meu medo gritante de criança era da meia noite. Não sei se alguém ja percebeu, mas tudo acontecia nessa hora maldita. É só ler os livros, ver nos filmes! E depois me borrava de medo do Quércia, sabe o Quercia, né? Orestes... quando estava aprendendo a ler, lia em todos os lados, lugares inatingíveis, escritos com cal: QUERCIA VAI VOLTAR, QUERCIA VEM AÍ... pânico. só podia ser coisa dos não-moradores desse planeta.
(Nunca aconteceu também. ufa!)
E agora que eu já escrevi o rascunho da bíblia aqui, eu vou teminar de ler seu arquivo.
De verdade. Obrigada.
(e não se assuste... rsrs)
Nossa, são medos de menina mesmo, me identifiquei com a maioria!! No fundo, somos todas tão parecidas, hehe.
Beijos
brescia, demorei mas cheguei a ler seu comentário!! Que bom que você "me reencontrou", viu?
E olha só que coisa, agora não precisa ter mais medo do Quércia! Quer dizer, pode ser que ele ainda venha como alma penada, né, o que pioraria tudo... mas é só pendurar uma réstia de alho na porta que tá tudo seguro. :-]
Um beijo e volte sempre!
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