segunda-feira, 22 de agosto de 2011

Aquele amigo inusitado

Consigo me lembrar bem dos muitos, muitos amigos que já surgiram na minha vida. Lembro de algumas amiguinhas desde o pré - inclusive da menina que chamavam de Caren-Careta, o que me fez avançar em um menino porque, canalha, aquilo magoava a minha amiga. Lembro de amigos da rua, dos primeiros anos de escola, das imediações da casa da minha vó, de amigos feitos em viagens, de amigos de longuíssima data e daqueles que deixaram de ser. Não me ressinto de absolutamente nenhuma amizade que fiz na vida. Todas trouxeram seus aprendizados - mesmo aquelas que viraram "rostos no corredor" (pra entender, melhor assistir "Conta Comigo", aquele tratado sobre amizade). Mas algumas amizades me surpreendem até hoje. São aquelas que não deveriam ter virado nada. Mas viraram, putzgrila, ainda bem.

Sempre fui de fazer amigos com relativa facilidade, mesmo que poucas vezes. Quero dizer: eu não era, assim, aquela que entrava no primeiro dia de aula gritando "e aí, cambada de puta e viado! Eu sou a Flávia, prazer, hein?". As amizades se anunciavam mais devagar pra mim - em geral em meio a algum "esse livro que você tá lendo parece legal, sobre o que é?". E, com a conversa engatada, nascia mais um amigo. Teve quem devolveu a iniciativa com um olhar de "não enche, sociopata", mas é a vida.

As amizades que eu me referi como as que "não eram pra ter virado", no entanto, começaram bem esquisitamente. Na faculdade, por exemplo, eu odiei a Giovanna desde o primeiro dia em que ela botou seu pé com salto-alto na classe. Ela sentava na primeira fileira, se vestia como gente grande, tinha emprego bom e queria responder tudo primeiro - tirando a MINHA chance de responder primeiro, como ousava??

A Giovanna tinha o meu repúdio, mas suspeito que ela também tinha repúdio a mim. Um bem grande. E foi assim por quatro anos: viradas de cara, narizes torcidos e lados opostos em tudo, das opiniões sobre o jornalismo até o distanciamento na mesa do bar. Malditos amigos em comum, que faziam a gente dividir uma mesma garrafa de cerveja vagabunda...

Até que um dia, num trabalho em grupo (suspeito que nos colocaram no mesmo grupo esperando um catfight), comentei que estava querendo sair desesperadamente do meu emprego. Giovanna comentou que tinha uma vaga na editora onde ela trabalhava. Se ofereceu pra levar meu currículo. Aceitei. Trabalhamos próximas por anos, até que um dia ela me viu organizando uma viagem pra Argentina, que eu pretendia fazer sozinha pra não enlouquecer, e se ofereceu pra ir junto. Aceitei. Fomos. Quase precisamos de cirurgia pra tirar os sorrisos da cara, de tanto que foi incrível.

Giovanna foi uma das minha melhores amigas por muitos anos. Por coisas da vida, nos distanciamos, mas ela jamais voltou a ser, pra mim, a insuportável do sapato de salto. Ela segue até hoje, na minha mente, como uma amizade que bizarramente vingou. Ela foi, no ramo das amizades, aqueles bezerros de duas cabeças.

Não bastasse, teve (tem!) a Bia. A Bia não era minha amiga, eu nem a conhecia. Ela foi colega de trabalho do Dono da Casa mais ou menos uns 2 milhões de anos atrás. Marido elogiava tanto a Bia, o trabalho da Bia, a esperteza da Bia, a sagacidade da Bia e os óculos de grau maneiros da Bia que eu fiquei ciumenta. E desgostei da Bia assim, só um pouquinho, como uma birrinha preventiva.

Mas aí a Bia casou e foi morar em Londres - e, quando o casal voltou, convidou o Dono da Casa "e a esposa" pra uma pizza. Antes da sobremesa eu já tinha me apaixonado pela Bia de uma maneira que acho que o marido, desta feita, é que ficou ciumento. Ainda fica, porque até hoje ele diz "mas a Bia é MINHA amiga, não SUA!". Eu deixo ele se indignar - e sigo ligando pra Bia quando eu quero, coisa nossa, ninguém tem nada com isso. Ela é como a irmã que eu sempre tive.

Querem mais? Teve (tem também!) a Fabiana. A Fabiana deve ser o caso mais estranho de todos. A Fabi era a namorada do melhor amigo de infância do Dono da Casa. Mas a Fabi também era a melhor amiga da namorada que o Dono da Casa tinha quando a gente se conheceu. Quando tudo se estabeleceu no nosso namoro, claro que a gente saiu pra conhecer esse amigo dele e a Fabi. Gostaria de dizer que me apaixonei pela Fabi antes da sobremesa, mas a verdade é que eu acho que ela me abominou antes do couvert.

E eu não fui muito fácil também. Não sabíamos, as duas, lidar com aquele "parentesco". Era estranho pra ela, eu tenho certeza. Era estranho pra mim também - ela era amiga da ex, pelamordedeus! Eu faço amigos até que facilmente, mas aquilo era mais do que qualquer uma de nós podia trabalhar.

Lá se vão uns 13 anos. E eu fico feliz em dizer que, de uns 10 pra cá, eu e a Fabi baixamos a guarda, falamos de um tudo e ficamos muito mais do que no melhor que podíamos ficar. No reveillon que passamos juntos, Fabi e eu protagonizamos conversas diárias compridíssimas - e eu lembro de cada uma com o maior amor, porque Fabi fala feito metralhadora como eu, pensa da família o mesmo que eu, tem gostos muito parecidos e é tachada de nervosinha (injustamente, né, querida?) do mesmo modo cruel. Fabi, eu tenho certeza, foi separada de mim na maternidade.

Numa conversa de porta, nesse fim de semana, Fabi dividiu comigo opiniões incríveis e acalmou meu coração só por me fazer ver que eu não estou só. A garota podia me virar a cara mais que todas, ignorando "aquela vadia nova que o Marcus arrumou" ou coisa assim. Mas eu e a Fabi temos tanto em comum que a gente nem precisa mais dos rapazes a tiracolo pra termos nosso lance.

Eu acho que essas amizades inusitadas todas só servem pra mostrar que, muitas vezes, vai de a gente se dar chance e dar chance aos outros. Aquela pessoa que você considera um porre, aquela bisca que se veste diferente de você, a nojentinha, a atacada, a bocó, a ex-o-que-quer-que-seja... todas elas podem não ser bem assim e virarem uma amizade como nunca antes. Eu fico contente de ter amizades assim na memória e no dia-a-dia.


Era pra ela ser só uma qualquer, mas ela virou tudo - até a "Tia Bia"


6 comentários:

Clá disse...

Adoro essses amigos de infância que a gente faz depois de velho...o bom e saudoso forum foi um ótimo berço de amizades....

bjokas Flá

bia disse...

comadre,
o dono da casa é um amigo mais do que querido, mas você é a irmã que eu não tive (tem jeito de não contar isso pra ele, peloamordeus??).
muito orgulho de ser a "tia bia" de uma garotinha incrível. vamos ver se consigo ganhar um beijão desse da lilica também.
me liga? se não, te ligo.
bj

Fabio disse...

Legal esse lance da amizade. Beijos!

Fabiana disse...

Seria fácil odiar a "intrusa", o problema era a tremenda afinidade que teimava em aparecer rs! Agora, não somos as "mulheres dos amigos de infância", criamos nosso próprio vínculo. Bem melhor, né? Um grande beijo, amiga!

Nanael Soubaim disse...

Eu não tinha amigo nenhum na infância, Flávia. Mas aprendi que é preciso se desarmar e dar a chance da aproximação.

Sócia da Light disse...

Bib, Lilica já está treinando beijos bem cheios de baba, tá? E eu sei que nem disso você vai reclamar, sua santa.

Fabi, as afinidades todas simplesmente não cessam, viu... Eu não canso de dizer, depois de todos os nossos encontros, que você sou eu com roupas mais bonitas, cabelo mais alinhado e muito mais valente! Rs!! Saudades já, amiga.