quarta-feira, 30 de junho de 2010

A bundamolice se apresenta

Eu era impávida. Nada me fazia parar. Dirigia 500 km só para ir a uma festa, de noite e na chuva. Voava o mundo inteiro naquela poltrona ridícula da classe econômica achando tudo incrível (e dormia como bebê). Encarava toda sorte de reportagem perigosa, entrevistava todo tipo de malandro, sacava dinheiro no caixa eletrônico à meia-noite sem nem olhar pros lados, via TV de perto e comia fruta sem lavar. Eu fui valente. Mas já faz alguns anos que desenvolvo preocupação, temor e reserva. Enfim, virei uma grandecíssima bunda-mole.

Quando eu era criança, apesar da timidez, sempre acabei me enturmando com um bom número de gente. Até entrava nos desafios da molecada da rua, o que acabou me rendendo um total avantajado de pontos espalhados pelo corpo. Destemida, tirei partidas de futebol e basquete com os meninos, corridas de patins e bicicleta com crianças maiores e até umas provas de resistência como "quem consegue comer um picolé em dois minutos". Era exporádico, é verdade. Mas acontecia. Era minha mente tentando superar o medo e a vergonha.

Em boa parte, até que superei. Adolescente, tinha umas ideias meio estúpidas de ir tomar suco no centro da cidade no sábado depois das 22h sem contar pros meus pais. Embarcava em qualquer viagem que me convidavam, fosse pra pegar ônibus, trem, táxi ou caminhar por 3 horas. Já mais velha, tive até um namorado ainda mais intrépido que fazia parte de um grupo que explorava cavernas.

E fui junto, me afundando no centro da Terra em meio a água, lama, frio, equipamento discutível, morcegos, peixes cegos e pedras temerariamente pontiagudas. Ali também desci rios usando bóias capengas e luxei tudo o que foi extremidade despencando de cachoeiras e escalando paredes. Usando umas cordinhas finas da porra!

Lembrando agora, é até difícil acreditar que fosse eu mesma fazendo aquilo. Hoje penso no dia em que o carro quebrou na estrada tarde da noite e eu ainda fiquei discutindo com um mecânico imundo e perneta sobre o preço do reparo. Eu não faço mais isso. Atualmente, vamos dizer assim... eu criei tenência.

Foi depois de formar família, eu acho. Pode parecer piegas, mas foi isso: ter marido, filhas e contas a pagar me fez um ser muito mais bunda-mole. O Dono da Casa viaja pelo menos duas vezes ao mês de avião - e eu já nem sei com quantos santos me peguei pra esse cara não terminar no fundo do Atlântico ou despedaçado numa selva. Saio pouco à noite, pensando muito em "não dar mole pro azar". Com a Sabrina no carro, dirijo feito uma idosa.

Fico preocupada em guiar mais rápido até mesmo sozinha - pensando "e se eu me acidento aqui, quem vai vestir o pijama certo nessas meninas??". E na hora de fazer comida... bom, a preferência vai pro que parece bom e saudável, assim eu posso tentar burlar umas doenças aqui e ali.

Não, eu não sou mais impávida. O tempo me fez mais contida e prudente, mais receosa e muito mais prevenida. Não quero passar por perrengues sérios e ficar longe dos meus queridos - apesar de, no fundo, saber que isso pode acontecer até quando tomo banho naquele box liso do inferno. Por outro lado, é muito, muito bom ter a lembrança dos "dias insanos". Mas que fiquem só na memória. Tudo tem sua hora, né? E por falar em hora, deixa eu ir ali checar se o Dono da Casa chegou bem ao destino. Bunda-mole que se preza sempre checa.


To serve and protect

12 comentários:

Ana Luísa disse...

Ahh, eu nunca fui corajosa assim. Sempre fui daquelas de pensar 500x antes de descer em um simples toboágua, hahaha.
Mas é legal ter histórias dessas pra contar! Embora eu aposte que vai rezar pra Sabrina e Olívia não terem assim, TANTA coragem de discutir com mecânicos no meio do nada, por exemplo
^^
Bjoss

Sócia da Light disse...

Ana Lu, se a Sá e a Olívia tiver 5% mais juízo do que eu tive e mentirem pros pais 1% menos, eu já me dou por muito feliz!! rss!

Anônimo disse...

Engraçado o funcionamento do ser humano, né? Também sempre fui muito tímida, mas um dia subi num palco para um concurso de miss e, o mais incrível, eu ganhei!
Morro de medo de altura, não subo nem a pau na Roda Gigante, mas adoro a montanha-russa e o elevador que despenca do Hopi Hari.
Nunca fui tão destemida como você, minhas aventuras ficaram restritas a infância/pré-adolescência em Maringá, aonde se podia brincar na rua, subir em árvores e muros! Andava a cidade inteira na companhia de amigos a pé sem maiores problemas até de noite.
Também deixei minhas aventuras no passado, mas sem neuras. É bom poder aproveitar as diferentes fases da vida! :)

Anônimo disse...

Eu gastei todas as minhas baterias na infância. Hj sou bem calminha, minhas aventuras se restringem aos livros, filmes, séries e videogames. UHUHuhHU...
Mas quando eu era menor, já fui atropelada 3 vezes(apenas escoriações), já caí do 2º andar (e não tive sequer um arranhão), me perdi umas 20 vezes (coitada da minha mãe) e fugi várias vezes dos vigilantes do condomínio quando ia explorar as casas em construção (foi de uma delas que caí do 2º andar)e tantas outras coisas...
Hoje quando eu penso nisso, eu imagino o desepero dos meus pais e olhe quem nem sou mãe, que eram tão cuidadosos e protetores e ainda assim eu conseguia aprontar. XD

Gabriela P. disse...

Acho que todos vamos perdendo a coragem conforme o tempo passa, né. Como uma criança que pula de um muro pros braços da mãe, por exemplo.
Mas como a Ana Lu disse, também sou medrosa. Nem montanha russa eu vou.
HUASIDHSIAUDS

Beijo, Flá!

Nanael Soubaim disse...

Quem não fez uma aventura até os vinte anos, não teve juventude; quem se atira às aventuras depois dos vinte não tem maturidade, ou filhos... ou ambos.

moniquinha disse...

Bem,
nunca fui aventureira,mas depois de virar mãe,virei tb uma bundona.

eu sempre digo que ser mãe é vier perigosamente,então não somos nada bunda mole,na verdade.

Sócia da Light disse...

Hahaha! Boa saída, Moniquinha!! Era isso que eu queria ouvir! Somos mesmo as criaturas mais corajosas.

;-D

Dri_ disse...

Além de "mais" bunda-mole, fiquei chorona.

Prova disso é essa foto aí, me deu um profundo nó na garganta...

Daniele disse...

Nossa, e eu q já nasci bundona!?
Minha mãe q era destemida, mas nada q se compare ao q cê falou, e mentia à beça. Conclusão: teve uma filha super certinha e q nunca fez nada escondido. Viu, ainda há esperança pra Sá e pra Olívia. :)
Queria ser mais corajosa, mas eu matuto demais pra tudo.

Sócia da Light disse...

Vai ver é assim mesmo, Dani, a coisa pula uma geração!! :-D

Anônimo disse...

Nossa Fla, eu tbm quando lembro das barbaridades que eu fazia eu tento esconder ate do meu DNA pra ninguem "pegar" as minhas doidices. Pq nao adianta, ta tudo no sangue.
Hj ate o dentista fica apavorado comigo, o ultimo ouviu: "veja bem doutor, maneira ai nesse novalcane, se meu coracao parar eu tenho 4 miquinhos insanos pra criar hein? EU NAO POSSO MORRER NEM HJ NEM AMANHA NEM NUNCA! Nao posso ouviu bem?"
Scary!
Mommy Miquenta